Projeto Formoso: sem saúde, estradas e água tratada, moradores denunciam abandono da CODEVASF, Distrito e Prefeitura

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Maior produtor de banana do Brasil, o Projeto Formoso, criado nas décadas de 80 e 90, em Bom Jesus da Lapa, Oeste da Bahia, vive uma triste contradição: enquanto maior gerador de riquezas do município, contribuindo com quase metade do PIB (Produto Interno Bruto) da cidade, a população dessa região reclama da ausência de condições básicas de sobrevivência. Sem ser notada pelo poder público, buscam o apoio da imprensa para mostrar a situação em que vivem.

Nessa sexta-feira (16), a nossa equipe mais uma vez foi à campo e constatou um cenário de dúvidas e medo que dá condição a vários questionamentos sobre o funcionamento e manutenção dos Projetos Formoso A e H.

Com relatos emocionantes e surpreendentes você pode acompanhar nesta matéria especial como vivem os moradores e produtores desse perímetro irrigado. Maior produtor de bananas do Brasil.

“O Estado esqueceu do Projeto, desconhece a realidade do povo”

O perímetro de irrigação do Projeto Formoso, administrado pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (CODEVASF) localizado no município de Bom Jesus da Lapa, no Médio São Francisco baiano, passou a ser  reconhecido como o maior produtor de banana do Brasil, graças a dissertação de mestrado apresentada por técnico da 2ª Superintendência Regional. Mostrando que o Projeto Formoso passou para 7,9 mil hectares cultivadas em 2016, produzindo cerca de 189 mil toneladas de itens agrícolas, principalmente frutas, mesmo em meio à estiagem prolongada. Responsável por R$ 238 milhões  do Produto Interno Bruto – PIB de Bom Jesus da Lapa, quase a metade da receita do município.

“Outra coisa é a poeira, a CODEVASF patrola a estrada duas ou três vezes no ano, fica o pó, e as pessoas adoecem muito, absorvem esse pó que é contaminado também, pois produtores jogam veneno com aviões, então a poeira também fica contaminada, muitas pessoas adoecem com problemas respiratórios por causa do pó”

Com essa notícia Bom Jesus da Lapa passou a ser referência a nível nacional na produção de riqueza, concentrada especialmente na produção de banana, no perímetro do Projeto Formoso A e H. No entanto, mesmo com o destaque no cenário brasileiro, a verdadeira realidade segundo os moradores é escondida. Os pequenos produtores e moradores falam que  o contexto é outro, fazendo diversas denúncias referentes a situação vivenciada pela população, como, falta de estrutura, de água potável, de segurança e de assistências básicas de saúde e de acompanhamento do poder público municipal e do Distrito, representação da CODEVASF responsável pela gestão da área.

Sr. Severino Francisco: “A gente tem ajudado, votado muito, vai indo a gente perde as esperanças, desacredita… Quando a gente sai aqui só vê a choradeira do povo, pessoas chorando sem um gole d’água, comprando água de fora, e cadê as águas? O prefeito fez alguma coisa? Não. Se tá fazendo eu não conheço.”

A realidade relatada pelos moradores para a equipe do Site Notícias da Lapa é alarmante, e vai contra os números e discursos dos dos órgãos do Governo. “O estado esqueceu do Projeto, desconhece a realidade do povo. Tem mais de 18 anos que estou morando aqui, as estradas sempre foram ruins, eles chegam coloca umas pedras ai, quando chove é cada buraco nessa estrada ai, para passar é um deus nos acuda, então aqui o benefício do Estado não tem. Aqui se você adoecer você morre, sabe por que? Porque não tem assistência. Dizem que somos distrito, que produz isso e aquilo. O Distrito ou a CODEVASF nunca fez (sic) nada, nunca ajudou. Se a CODEVASF contribuiu com alguma coisa aqui foi para eles lá, porque aqui não chegou nada não. A população aqui está quase abandonada. O único benefício que chega pra nós aqui é o talão de água, desse tamanho [fazendo gesto aberto com os braços] pra você pagar, k1 e k2, só isso. As pesquisas (análises) que tem aqui, diz, se você beber essa água do canal você morre, tanto ataca coceira como enche de verme. Água potável aqui é um sonho, tive que comprar essa caixa aqui para poder aparar água da goteira. Então, tomar água do canal você fica doente, o canal ai é cheio de verme, já morreu cachorros e cavalos, a céu aberto ai. “, disse o Sr. Severino Francisco que mora no projeto a quase 20 anos, quando deixou Serra do Ramalho pensando que seria melhor.

O pequeno produtor reclama  da CODEVASF e da gestão municipal, “falaram que o prefeito doou para o distrito 40 mil reais para consertar os caminhos, nunca foi consertado aqui, estrada é cheia de buraco de um canto para o outro, e tudo é assim desse jeito, a contribuição que eu sei do município é essa”.

“O município colocou uma caixa d’água nos setores, e o pipa coloca água para o povo pegar, no entanto não resolve, nem todos podem pegar, muita gente termina consumindo a água do canal. No tempo de chuva a gente não pode tomar banho, a gente não pode cozinhar, e muito menos beber.”

“Aqui no Setor 33 tem de 480 a 500 famílias que reclamam muito, quando chega a época da chuva a água do canal fica como se fosse a lama da estrada, lama, lama, e lama. Isso é muito triste, a gente sabe que o projeto é tão rico, e que as pessoas não têm direito, enquanto Bom Jesus da Lapa sobrevive do Projeto, na verdade o Projeto é a mãe de Bom Jesus da Lapa, e a gente não tem água tratada, não tem estrada. Os prefeitos que passaram por Lapa sempre esqueceram do projeto”, disse a agente de saúde.

“A maioria das crianças procuram a unidade de saúde aqui com problema de pele, com coceira, micose, hepatite, micose é comum aqui, em crianças e adultos também, as pessoas aqui tem muito verme. A médica que vem aqui é a que sofre mais, diz que o problema é a água, e ela não pode fazer nada”.

Os moradores disseram ainda que alguns dos grandes problemas são a poeira e o veneno jogado pelo avião de pulverização, “a CODEVASF patrola a estrada duas ou três vezes no ano, fica o pó, e as pessoas adoecem muito, absorvem esse pó que é contaminado também, as pessoas jogam veneno com aviões, então a poeira também fica contaminada, muitas pessoas adoecem com problemas respiratórios por causa do pó, além do  veneno que cai no canal e cai na estrada também. A gente que está dentro da Vila quando o avião passa sentimos o cheiro forte do veneno, complicada a situação do projeto”.

O Distrito é uma associação com fins lucrativos , responsável pela arrecadação e administração do Projeto Formoso. Moradores falam sobre uma suposta dívida junto a COELBA: “Teve uma época aqui que a gestão do Distrito estava com uma dívida de 5 milhões, para o projeto não parar eles subiram o preço da água, nós pagávamos R$ 600 passamos a pagar R$ 1.200, ligeirinho assim, porque o débito estava grande com a COELBA, a gente não sabia de nada”.

Os moradores afirmam que não sabem de fato quem é responsável pelo Projeto Formoso, procuram a CODEVASF ela diz que repassou recurso para o Distrito, o Distrito fala que não tem recurso para fazer estrada e resolver problemas de estrutura, procuram a prefeitura, falam também que é a CODEVASF  a responsável. “Eu não entendo, parece que não somos parte do município. E o que nós contribuímos de impostos? Com essa riqueza que falam que é de Bom Jesus da Lapa, a prefeitura também tem que assumir”, conta o morador.

Local onde á água sem tratamento é captada e jogada para a caixa, que é distribuída para para aproximadamente 500 famílias no setor 33.”A gente já foi em Brasília, eles desconheciam nossa realidade, falaram que era um projeto rico, quando relatamos a situação da água, falaram que nunca um produtor tinha ido lá relatar algo, pensavam que aqui as coisas eram mil maravilhas”.

O pequeno produtor Ademir lamenta a situação, e afirma que os órgãos responsáveis pelo projeto não dão satisfação, e denuncia. “A gente que precisa conviver com a sujeira dessa água aí, mais a CODEVASF não está nem aí. A CODEVASF foi um órgão que foi criado para ajudar o produtor, o Distrito também que é uma empresa, mais trabalha contra o produtor, não dá apoio, não dar liberdade, trava tudo para o produtor. Muitas coisas que acontecem  aqui na CODEVASF de Brasília eles não têm conhecimento, aqui eles travam tudo as informações, querem que o produtor viva sem esclarecimento. A gente já foi em Brasília, eles desconheciam nossa realidade, falaram que era um projeto rico, quando relatamos a situação da água, falaram que nunca um produtor tinha ido lá relatar algo, pensavam que aqui as coisas eram mil maravilhas”.

“A responsabilidade hoje de administrar o Projeto é de quem? A CODEVASF diz que não é, o Distrito diz que não é, a prefeitura também diz que não é. Se a gente está dentro do projeto que é o município, a prefeitura que recolhe os impostos tem responsabilidades, até um abaixo-assinado que fizemos cobrando um adutora o prefeito falou na rádio que não ia dar em nada.

“Aqui tinha uma cooperativa, o pessoal do Distrito acabou, a associação acabou, vai entrando os empresários e os pequenos vão se afastando, não acreditando mais. A gente tinha que saber das coisas aqui, o Distrito tinha que informar, não prestam conta de nada. Teve uma época aqui que a gestão do Distrito estava com uma  (suposta) dívida de 5 milhões, e para o projeto não parar, eles subiram o preço da água, nós pagávamos R$ 600, passamos a pagar R$ 1.200, ligeirinho assim, porque o débito estava grande com a COELBA e a gente não sabia de nada. Essa dívida não foi do produtor não, que pagava direitinho”, afirmou.

“Já caíram no canal, crianças, adultos, bêbados. As pessoas vêm de moto e caem, não tem nem uma proteção ou placa alertando o perigo. Aqui é complicado, a gente cobra da CODEVASF que não se importa, é difícil. A gente procura muito a CODEVASF, ela nunca resolve”.

Segundo Ginalva, pequena produtora do setor 4, a luta da população do projeto é muito grande, já são mais de 20 anos que a população clama, e passam sempre despercebidos para as administrações de Bom Jesus da Lapa. “Aqui a gente vai usando essa água e criando resistência, imunidade, só que é uma saúde muito insegura. Muitas famílias já tiveram que deixar o Projeto devido essa situação. A realidade daqui é essa, só que eu não vou apavorar, ter que mudar daqui. Se você for parar para pensar, a água daqui faz medo mesmo, mais eu  penso, porque esse povo está aqui, deve ter uma razão. Aqui foi um lugar que eu escolhi para viver, para sobreviver, que eu coloco a comida na mesa para os meus filhos. Quem pode embora tem essa alternativa, no entanto tem muitos que não tem opção, tem que aguentar tudo isso.

“As autoridades que compete divulgar os fatos, escondem, parece que tentam encapar, esconder. Aqui é um descaso, descaso toda vida, os órgãos que competem olhar, é descaso. E a culpa maior é da CODEVASF, se isso aqui é um projeto da CODEVASF, um projeto dela”.

“Você sabe conhece a palavra sofrimento, cê sabe não né? A gente sabe aqui. Porque quando chove aqui esse barro aqui é triste, ai o caminhão não entra, para pegar banana tem que baldear, um trator e um caminhão pequeno, o pior que não temos muito a fazer, só pedir a Deus”, disse José Cardoso, pequeno produtor.

“A gente pede a chuva depois pede para estiar, porque estrada não tem. Esses dias aqui virou um caminhão bem ali, ele veio e virou ai, com uma carga, prejuízo total, uma bagaceira”.

A presidente da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (CODEVASF), Kênia Régia Anasenko Marcelino, esteve em Bom Jesus da Lapa no dia 02 deste mês, onde anunciou uma série de investimentos em equipamentos, em torno de 4,3 milhões em equipamentos, patrol, roçadeira e motoniveladoras. (RELEMBRE AQUI)

Até o fechar dessa matéria não conseguimos contato com os responsáveis pela  administração do Distrito.

O espaço está à disposição para as versões de todos os citados nesta reportagem.