O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) negou o pedido da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Bahia (OAB-BA) para anular a reorganização da Justiça Federal no estado. O pedido foi feito em um procedimento de controle administrativo contra o ato do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).
Através da Resolução Presi n. 9606429, o TRF-1 alterou a jurisdição da Seção Judiciária da Bahia e das subseções Judiciárias de Alagoinhas, de Bom Jesus da Lapa, de Campo Formoso, de Feira de Santana, de Guanambi, de Ilhéus, de Itabuna, de Jequié, de Paulo Afonso e de Vitória da Conquista.
Por maioria dos votos, o plenário do CNJ negou o pedido da Ordem baiana por entender que a alteração das áreas de jurisdição de seção e subseções judiciárias “se insere no campo da autonomia administrativa dos Tribunais Regionais Federais”, sendo inaplicável à espécie os critérios fixados por este Conselho na Resolução CNJ n. 184/2013, que enumera referenciais para extinção, criação e transformação de unidades jurisdicionais.
A relatora foi a conselheira Salise Sanchotene. Os conselheiros Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto e Silva e Luiz Fernando Bandeira de Mello votaram pela anulação do ato impugnado. O pedido foi julgado no último dia 26 de agosto, no plenário virtual.
A OAB-BA, anteriormente, havia apresentado um pedido de providências para anular o ato do TRF-1, mas foi arquivado monocraticamente. A Ordem foi contra o remapeamento de algumas áreas de competência da Seção Judiciária da Bahia. Disse ainda que, desde o início do procedimento foi proposto a ampliação da base funcional da Subseção Judiciária de Paulo Afonso, distante 470 KM de Salvador, com a instalação de uma segunda vara federal na cidade. A proposta chegou a ter parecer favorável de órgãos do próprio TRF-1, e até mesmo voto do presidente do Regional.
A OAB reclama que, ao invés de aumentar a jurisdição, o TRF-1 diminuiu a abrangência da Justiça Federal na região, transferindo as cidades de Banzaê, Canudos, Euclides da Cunha, Quijingue e Tucano para a subseção de Feira de Santana, que é a segunda maior da Bahia, transferindo ainda as execuções fiscais para Salvador.
A Ordem afirma que a decisão do Órgão Especial do TRF-1 é prejudicial a população ao ampliar o acervo processual de Feira de Santana e de Salvador, comprometendo, assim, “o acesso à justiça e a eficiência na prestação da Jurisdição”.
Outro argumento da OAB foi o “grave risco para os jurisdicionados e as jurisdições, pois afeta de modo imediato o acesso à justiça dos cidadãos de Banzaê, Canudos, Euclides da Cunha, Quijingue e Tucano, cidades paupérrimas, em especial daqueles que demandam questões previdenciárias, normalmente os mais pobres entre os pobres”.
A Ordem requereu a anulação do ato para manter o mapeamento das subseções na Bahia, que não foram objeto de prévio estudo, análise e debate”. Posteriormente, a OAB requereu a revogação completa da resolução. A relatora solicitou parecer técnico ao Departamento de Pesquisas Judiciárias/CNJ, que consignou o seguinte: “Nos presentes autos não se apresenta ato que crie, extinga ou transforme unidades judiciárias, mas tão somente ato que modifica a competência territorial de unidades já existentes. Isto posto, conclui-se que não se aplica a Resolução CNJ 184/2013 ao presente caso”.
A OAB baiana ainda argumentou que o TRF-1 preferiu prejudicar os cidadãos que dependem da Justiça Federal para não causar prejuízo a “aspiração natural” de magistrados que pretendem se ver promovidos para a Capital e evitar o deslocamento de poucos servidores para o interior. Acrescentou ainda que a medida tem o mesmo efeito prático que a “extinção” das unidades judiciárias.
Para a relatora, entretanto, o ato do Regional Federal “não configurou flagrante ilegalidade ou inconstitucionalidade, mas legítimo exercício das atribuições constitucionais outorgadas aos Tribunais”. A conselheira assevera que o ato não foi uma “extinção, criação e transformação de unidades judiciárias”, mas de redistribuição de competências de algumas unidades.
VOTO DIVERGENTE
O conselheiro Marcos Vinícius Jardim, ao divergir da relatora, afirmou que “o deslocamento de Varas da Capital para o interior não atende à ordem natural das coisas”. “Além do retrocesso institucional que isso implicaria, diante do esforço do Tribunal, ao longo de anos, para dotar Salvador de 24 varas, a parte operacional seria assaz problemática, dado o deslocamento, em tese, dos servidores para interiores distantes”, diz o relator. Uma solução seria alterar a jurisdição para excluir os municípios de Irará, Ouriçangas e Pedrão da área de jurisdição da subseção Judiciária de Alagoinhas e incluí-los na área de jurisdição da subseção Judiciária de Feira de Santana.
Também seria excluir os municípios de Capela do Alto Alegre, Mairi, Nova Fátima, Queimadas, Retirolândia, Santaluz, São Domingos e Valente da área de jurisdição da subseção Judiciária de Campo Formoso e incluí-los na área de jurisdição de Feira de Santana.
Ainda seria uma solução alterar a jurisdição para excluir os municípios de Ubaitaba, Ibirapitanga, Aurelino Leal, Gandu, Piraí do Norte, Presidente Tancredo Neves, Teolândia e Wenceslau Guimarães da área de jurisdição da subseção Judiciária de Ilhéus para incluí-los na área de jurisdição da de Itabuna, por exemplo.
“Em nome da legitimidade inescusável da Advocacia, bem como da imprescindível transparência, haveria de ser franqueada a manifestação da Ordem, o que, ingloriamente, não ocorreu. No contexto, com a devida vênia à fundamentação contida na decisão recorrida, tenho que o remapeamento das competências das unidades jurisdicionais federais do interior do estado da Bahia demanda análise qualitativa e não meramente quantitativa. Sob essa perspectiva, recordo que a maior parte dos jurisdicionados daquelas localidades é constituída por trabalhadores rurais hipossuficientes e pessoas abaixo da linha da pobreza, que serão demasiadamente prejudicados com a medida, impactando, ainda, o exercício da Advocacia local”, criticou o vistor.
Segundo estatísticas apresentadas pela Secretaria de Governança, Gestão Estratégica e Inovação (Secg) do Tribunal, havia preocupante discrepância entre a movimentação processual das subseções acima indicadas e as varas de Salvador. A Subseção Judiciária de Paulo Afonso possuía distribuição de 235% da média da 1ª Região; Alagoinhas de 200%; Guanambi de 193%; Jequié de 169%; Irecê de 168%; e Ilhéus de 157%. Em adição, tais unidades estavam entre as dez subseções judiciárias que mais distribuíam processos na Justiça Federal da 1ª Região. As unidades de Salvador, por outro lado, apresentavam distribuição processual abaixo da média: as varas cíveis apresentavam, no triênio 2016-2018, distribuição no patamar de 75% da média regional; os juizados especiais federais, 79%, e as cinco varas de Execução Fiscal, 74%.
A partir desses dados, o Tribunal inicialmente propôs alterar a jurisdição de algumas subseções judiciárias e o deslocamento da 3ª e 5ª Varas Federais de Salvador para Paulo Afonso e Guanambi, respectivamente, o que amenizaria, em parte, o problema de excesso de movimentação processual nessas Subseções. O vistor assevera que o TRF-1, não observou a Lei Federal Lei n. 10.772, de 21 de novembro de 2003, sobre a necessidade da interiorização da Justiça Federal de 1º Grau, aproximando o cidadão da Justiça. “Ademais, não parece compatível com o interesse público que a reestruturação realizada tenha sido norteada por anseios funcionais de magistrados e servidores em residir na Capital ou em locais de melhor conveniência pessoal”, declarou o conselheiro. Marcus Vinicius Jardim prevê que haverá uma sobrecarga das unidades da Justiça Federal em Salvador, “com perdas em celeridade e efetividade da prestação jurisdicional”. Implica, ainda, conforme avalia, em “entraves aos advogados e jurisdicionados habitantes no interior, em especial das regiões do extremo oeste e vale do São-Francisco, dada a necessidade de grandes deslocamentos e expedição de cartas precatórias para cumprimento de atos processuais”. A região de Paulo Afonso tem uma distribuição de 220% a mais em relação à média do TRF-1. Ele ainda lembra que a subseção é isolada ao norte da Bahia, “o que torna remota a ajuda de outras varas federais”. O conselheiro afirmou que a medida adotada pelo TRF-1 é “inadequada aos fins a que se destina, macula os princípios constitucionais da eficiência, do interesse público e do acesso à justiça; contraria a política de interiorização da Justiça Federal de 1º grau, além de ferir, expressivamente, as prerrogativas do profissional da advocacia”. (BN)