RedeGN
O Rio São Francisco será um dos maiores prejudicados nas alterações feitas no relatório preliminar da Medida Provisória (MP) 1031 que autoriza a privatização da Eletrobras e está tramitando no Congresso Nacional. Na proposta original, estava previsto um aporte de R$ 9 bilhões na revitalização do Rio São Francisco.
Agora, são R$ 3,5 bilhões em ações de revitalização do Velho Chico por 10 anos dentro de um total de R$ 8,75 bilhões, que serão divididos também com iniciativas na área de recursos hídricos nas bacias hidrográficas de Furnas (no Sudeste), no Norte do País e até do Rio Parnaíba, localizado entre as divisas do Piauí e do Maranhão.
Rio mais importante do Nordeste, o São Francisco passa por vários problemas ambientais. E também é o mais importante para dar acesso à água potável numa parte do Nordeste – chamada setentrional -, que inclui áreas semiáridas de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. A Eletrobras é a dona da Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf), uma das empresas que mais se destacam dentro da holding.
Nos bastidores do Congresso, se comenta que os recursos de revitalização do São Francisco foram divididos para aumentar o apoio político na futura votação do relatório da MP, que deve ocorrer na próxima semana no Congresso Nacional. O que se desconfia é que esses recursos serão usados para ações que reforcem a força de feudos políticos regionais. O relatório definitivo da MP 1031 deve ficar pronto até este final de semana.
Voltando ao relatório, o São Francisco não perdeu só recursos que poderiam ser importantes para a sua revitalização. O relatório também propõe que os recursos destinados às ações de revitalização dos rios São Francisco, Parnaíba e aos reservatórios de Furnas sejam gerenciados pela diretoria executiva da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), que está sendo investigada pelo Tribunal de Contas da União por 29 pregões – para contratação de pavimentação – por suspeitas de irregularidades, entre outras coisas.
No projeto anterior, os recursos seriam geridos por entidades independentes. O Rio São Francisco tem um comitê gestor ativo com participantes da sociedade e a estatal que mais tem dados sobre o Velho Chico é a Chesf que faz o monitoramento das chuvas e outras informações relativas ao rio por mais de seis décadas.
“É inconcebível passar esses recursos para uma empresa que tem frequentado as páginas dos jornais como um instrumento de cooptação política do governo federal“, diz o líder do PSB na Câmara dos Deputados, Danilo Cabral, se referindo a Codevasf. Ele também é presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Chesf e argumenta que “as medidas compensatórias, como a dos recursos destinados às ações ambientais, têm a duração de 10 anos, enquanto a futura concessão será de 30 anos“.
Vendas: A atual comercialização das ações da Eletrobras segue os moldes definidos no projeto que tramitou no Congresso desde 2017, elaborado no governo do presidente Michel Temer (MDB). Com a venda das ações, o governo federal deixaria de ser o grande acionista do sistema Eletrobras.
“Ninguém está dizendo qual o impacto que essa privatização vai ter na conta de todos os brasileiros. No projeto anterior, a própria Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) fez um estudo dizendo que a privatização provocaria um aumento de 16% na conta de todos os brasileiros“, comenta. E acrescenta: “Da outra vez, a discussão era em cima de um projeto de lei. Agora, é num relatório de uma MP num debate feito sem respostas fundamentais. O custo dessas hidrelétricas vai aumentar quando for feita a descotização“.
Esse termo se refere ao fato de que grande parte das usinas hidrelétricas da Eletrobras são antigas e trabalham atualmente no sistema de cotas, recebendo um pagamento somente para a manutenção e operação dessas unidades, como são quase todas as hidrelétricas da Chesf, com exceção de Sobradinho. Isso ocorre porque o investimento estatal realizado para implantar esses empreendimentos já foi pago por todos os brasileiros na conta de energia durante muitos anos. O que alguns técnicos e parlamentares suspeitam é que o valor a ser cobrado por esta energia, quando a empresa tiver acionistas privados – vai ficar mais alto do que o atual.
A expectativa é de que o relatório da MP seja aprovado pelo Câmara dos Deputados, já que os aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) devem ter maioria na votação. Em 2018, os parlamentares da oposição conseguiram postergar a votação na Câmara dos Deputados e o projeto acabou sendo retirado da pauta.
A atual MP tem que ser votada até o dia 22 de junho, quando acaba a sua vigência. A reportagem do JC entrou em contato com a assessoria de imprensa do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), líder do governo no Senado, mas ele estava “focado na CPI”, e também procurou o relator do relatório da MP 1.031, deputado federal Elmar Nascimento (DEM), que não pode atender o JC e informou que o relatório ainda é preliminar.
Jornal do Comércio