Na manhã dessa quinta-feira(4), no auditório do Colégio Modelo de Bom Jesus da Lapa, foi realizada a Audiência Pública para debater os impactos causados na calha do rio São Francisco pelo rompimento da barragem com rejeitos de minérios em Brumadinho – MG. A iniciativa foi do Ministério Público do Estado – MP-BA, que considera real o risco da contaminação das águas do Velho Chico com os rejeitos.
Estiveram presentes no evento representantes de ONGs, estudiosos das áreas discutidas, Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – INEMA, Ministério Público Federal – MPF, Ministério Público Estadual – MP-BA, Diretoria de Vigilância Sanitária e Ambiental do Estado da Bahia – DIVISA, Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco – CBHSF, Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Corrente- CBHRC, Codevasf, Embasa, SAAEs, estudantes, movimentos sociais, prefeitos, vereadores e secretários de vários municípios. Os representantes do SOS Mata Atlântica, do IBAMA e da Empresa Vale foram convidados, mais não compareceram.
O principal debate da reunião girou em torno do resultado da expedição da SOS Mata Atlântica e das analises da Fundação Joaquim Nabuco, que divulgaram relatórios afirmando que os rejeitos contaminados pelo rompimento de barragem da Vale já chegaram no rio São Francisco. Tese que foi contestada pelos órgãos do estado presentes no debate.
De acordo o IGAM- Instituto Mineiro de Gestão das Águas, que apresentou um relatório, feito junto com a Agência Nacional das Águas -ANA, A Companhia de Saneamento e Água de Minas Gerais – COPASA e com a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais – CPRM, os rejeitos não ultrapassaram a Usina Hidrelétrica de Retiro Baixo, entre Curvelo e Pompeu, e que não houve tempo hábil para o material chegar no Velho Chico.
Conforme a fala de Heilton Soares Moreira, Diretor de Operação de Eventos Críticos do IGAM, os informativos elaborados pelo órgão, com a colaboração da ANA, COPASA E CPRM, com análises semanais, até o presente momento não se observam alterações na qualidade das águas na estação de amostragem localizada na jusante da Usina Hidrelétrica (UTR) Retiro Baixo, que indique a chegada de rejeitos neste trecho. E que as únicas alterações apresentadas nas análises, não estão relacionadas ao desastre.
O representante da Comissão Pastoral da Terra – CPT da Diocese de Bom Jesus da Lapa, Samuel Brito, frisou em sua fala que é importante ter uma visão mais ampla da dimensão da bacia hidrográfica, e que uma hora ou outra as partículas da lama de Brumadinho que estão descendo no rio Paraopeba vão chegar no São Francisco, já que qualquer impacto em uma vereda ou afluente, mesmo sendo contido, a tendencia é que chegue na calha do seu subafluente.
Samuel disse que essa tragédia em Brumadinho precisa ir além da discussão técnica, já que o fato não aconteceu ao acaso, já era esperado, considerando o modelo produtivo do país, da matéria primária para exportação, que só visa o lucro. E que o crime causado pela empresa Vale, o estado brasileiro também é culpado, já que ele é conivente, porque cria políticas que facilitam a exploração do minério, conforme os interesses dos grandes grupos. E chamou a atenção do público para os impactos que estão sendo causados na região pelo agronegócio.
Timóteo Silva, que faz parte da coordenação nacional do Movimentos do Atingidos por Barragens – MAB, disse que é preciso a sociedade se organizar, para cobrar maior compromisso do estado. Lembrando que mesmo depois do rompimento da barragem (Fundão) da mineradora Samarco, em 2015, que é controlada pela Vale e pela BHP Billiton, onde as pessoas tiveram os seus direitos violados, nada foi feito. E agora, com o crime de Brumadinho, mais uma vez a sociedade tem os direitos violados.
O representante do MAB destacou, que é preciso refletir, e ver o que está acontecendo. Já que não dá para defender um modelo que só prioriza o lucro, destruindo tudo, sem nenhum compromisso com a sociedade brasileira. “Quem é que lucra com isso, nós?”, questionou, e lembrou”: Nós que moramos nas margens do rio São Francisco, que moramos na bacia do Velho Chico, temos que pensar e nos posicionar em defesa da nossos rios, já que sem água não conseguimos viver”, finalizou.
Anselmo caíres, representante do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco – CBHRF, destacou a importância da atuação MP na bacia. Ele afirmou que o rio Paraopeba morreu, que é uma situação que precisa da solidariedade de todos, tanto com as mais de 200 vítimas, como também com a questão ambiental. E disse que não dá para contestar os laudos apresentados pela SOS Mata Atlântica e a Fundação Joaquim Nabuco, que afirmam que o rio São Francisco já foi contaminado. “Dizer que a água não chegou em Três Maria, seria uma utopia, e a gente precisa ter maturidade nessa questão”, alertou.
Representando os prefeitos da Bahia, o presidente da União dos Municípios da Bahia – UPB e prefeito de Bom Jesus da Lapa, Eures Ribeiro, destacou que os municípios precisam se unir ao Ministério Público, reconhecendo o grande trabalho da promotora Dra. Luciana Khoury na bacia do rio São Francisco e na Bahia. “Estamos aqui preocupados, buscando dar a nossa contribuição em defesa do rio São Francisco”, afirmou
Eures cobrou mais clareza nos laudos apresentados pelo estado, que precisam ser confrontados, por parte dos órgãos envolvidos com os estudos, já que SOS Mata Atlântica diz que o rio São Francisco já foi contaminado, enquanto a IGAM diz o contrário.
Segundo a coordenadora do Núcleo de Defesa do São Francisco – Nusf, promotora de justiça Luciana Khoury, a audiência pública cumpriu o seu propósito de trazer informações sobre a atuação do MP de modo preventivo a acompanhar os potenciais impactos do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho na bacia do São Francisco. Apresentou para a população estudos que estão sendo produzidos em linhas gerais na Bahia, para poder acompanhar tal situação. E MP e órgãos do estado conseguiram colher informações da sociedade civil e dos movimentos sociais, das comunidades tradicionais, dos prefeitos municipais que se fizeram presentes.
E destacou que a grande a participação de representantes dos municípios de Bom Jesus da Lapa, Serra do Ramalho, Carinhanha, Malhada, Santana, Jaborandi, Santa Maria da Vitoria, São Feliz do Coribe, Paratinga, dentre outros o que demonstra a grande preocupação da sociedade com o Velho chico, a solidariedade às vítimas de Brumadinho e a cobrança por ações concretas de impedir impactos na bacia e a responsabilização dos culpados pelos danos.
Encaminhamentos
1- Como encaminhamentos foram pautados a orientação aos prestadores de serviço de abastecimento, seja Embasa ou o Saae, através da divisa de padrões a serem utilizados no monitoramento das águas, bem como a necessária antecipação do monitoramento dos metais pesados com informações ao vigiagua.
2- A realização de reunião com o Inema para tratar de monitoramento da água bruta.
3- Recebimento dos laudos e interpretações do SOS Mata Atlântica e Fundação Joaquim Nabuco, para compreender as diferenças dos resultados com os órgãos oficiais.
4- Realização de ações de Educação Ambiental focada nos impactos da mineração e de outros danos ambientais.
A audiência realizada na cidade de Bom Jesus da Lapa deixou claro que todos os municípios da região estão solidários as vítimas em Brumadinho, indignados com a tragedia, e preocupados e apreensivos com impactos no São Francisco que já vem sofrendo com uma crise hidroambiental.
Veja mais foto da audiência na página do Facebook do site Notícias da Lapa.