Ex-funcionário do MEC alvo da PF recebeu 14 vezes fornecedor de kit de robótica aliado de Lira

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Por Folhapress

Lira e aliados reunidos | Foto: Reprodução

Alexsander Moreira, que esteve lotado no MEC de 2016 até o início de junho deste ano, recebeu 14 vezes Edmundo Catunda, empresário próximo do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Catunda é dono da Megalic, a empresa alagoana que tinha contratos com vários municípios para fornecer kits de robótica.

Os encontros ocorreram entre 2020 e 2021, ainda no governo Jair Bolsonaro (PL).

As investigações da PF tiveram início após reportagem da Folha mostrar, em abril de 2022, que o governo Bolsonaro destinou R$ 26 milhões para sete cidades alagoanas comprarem soluções robóticas, apesar de sofrerem com graves deficiências de infraestrutura —o valor equivalia a 68% de tudo que fora pago em todo o país na rubrica para compra de materiais, evidenciando priorização nas transferências.

Todas as cidades tinham contrato com a mesma empresa, a Megalic. Os recursos federais, liberados e transferidos em velocidade incomum, eram das chamadas emendas de relator, parte bilionária do orçamento da União controlada por Lira. A Folha também revelou que a Megalic pagou R$ 2.700 pelos robôs e vendeu para prefeituras por R$ 14 mil.

A família Catunda tem relação estreita com Lira. A Folha mostrou que Edmundo Catunda foi ao FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) com Luciano Cavalcante, o mais próximo assessor do presidente da Câmara e também investigado. Os recursos que abasteceram as compras saíram do FNDE.

A PF encontrou com Cavalcante documentos com citações a Lira e uma lista de pagamentos atrelados ao nome de “Arthur”. O documento apreendido relaciona R$ 834 mil em valores pagos em 2022 e 2023 —desse total, em ao menos R$ 650 mil há à frente do valor o nome “Arthur”.

As investigações foram parar no STF (Supremo Tribunal Federal) após a PF encontrar as citações diretas a Lira. O deputado e seu auxiliar negam irregularidades.

Edmundo Catunda e Alexsander Moreira foram procurados, mas não responderam aos questionamentos. Com relação a Moreira, as autoridades identificaram movimentações financeiras suspeitas de R$ 737 mil, sendo parte do valor depositada em espécie, entre outubro de 2021 e novembro de 2022. Ele também recebeu três depósitos de um homem cuja empresa foi representada por Edmundo Catunda.

No governo Bolsonaro, Moreira era coordenador-geral de Apoio às Redes e Infraestrutura Educacional do MEC. A área tem atuação no sistema de transferências de recursos por onde saiu o dinheiro para os kits, o chamado PAR (Plano de Ações Articuladas).

Foi ele quem assinou uma nota técnica para subsidiar resposta do governo Bolsonaro a indagações do TCU (Tribunal de Contas da União). Um dos pontos questionados pelo tribunal foi o preço base de R$ 176 mil para cada solução de robótica (que inclui os robôs, material didático e treinamentos).

Esse valor constava dentro do PAR, apesar de o governo não ter ata de registro para esse tipo de compra. As prefeituras adquiriram os kits a partir de concorrências realizadas nos municípios e que tinham a Megalic como vencedora, mas que seriam pagas com dinheiro federal.

Nessas atas municipais, constava o mesmo valor de R$ 176 mil. A nota técnica assinada por Moreira defendeu o preço incluído no PAR. O TCU, por sua vez, concluiu que não há documentos, como memória de cálculos, capazes de fundamentar esse valor.

Dois filhos de Catunda, o ex-assessor legislativo João Pedro e o vereador de Maceió João Victor Catunda (PP), também estiveram com Moreira ao menos 12 vezes, sendo três delas em companhia do pai. Os dois são citados na investigação. As informações da agenda de Moreira foram obtidas via Lei de Acesso à Informação.

Os dados mostram que Moreira ainda teve encontros com uma assessora legislativa do vereador João Catunda. Chamada Catharyna Davilla Duarte Barbosa, ela foi apontada pela secretária de Educação de Flexeiras (AL), beneficiada com kits de robótica, como consultora na liberação dos recursos no sistema do MEC.

Essa secretária disse à Folha, em abril de 2022, que Catharyna começou seu trabalho com a prefeitura no caso de robótica e atuou em outros trâmites ligados ao MEC. Ela também relatou que foi a intervenção de Lira que garantiu o repasse para o município.

O vereador Catunda afirmou, em nota, que nunca tratou do tema robótica com Moreira, que foi ao MEC por ter atuação com o tema da educação e que encontrou o ex-funcionário por indicação de alguém do ministério, não especificado, para falar sobre Fundeb.

“É notório que meu foco sempre foi o trabalho junto às pautas educacionais”, diz a nota. João Catunda afirma ainda que a assessora Catharyna Barbosa esteve com o ex-funcionário representando a Comissão de Educação da Câmara de Maceió, que “tem procurado fiscalizar e acompanhar os convênios no âmbito do PAR”.

Também em nota, Catharyna Barbosa argumentou que esteve com Moreira a pedido de João Catunda, que preside a Comissão de Educação da Câmara de Maceió, para tratar “exclusivamente sobre os temas de educação básica do município de Maceió, no caso específico, de convênios de obras de construção de creches paralisadas no município”.

Moreira entrou no MEC em novembro de 2016, no governo Michel Temer (MDB), quando o deputado Mendonça Filho (DEM-PE) era o ministro. Sua agenda indica envolvimento em debates sobre compras de robótica ao menos desde 2017.

Antes de chegar ao MEC, ele trabalhou por dois anos na empresa Pete, principal fornecedora dos equipamentos robóticos para a Megalic. Moreira tem ligação com outros dois investigados que também trabalharam na Pete. Uma dessas pessoas é atualmente funcionária da Megalic.

Ele havia sido promovido pelo governo Lula (PT) ao cargo de diretor, mas foi exonerado após ser alvo de operação da PF.